(Texto escrito em 2020)
Eu tinha muitos planos pra esse ano.
Ano de formatura parece um misto de libertação com apreensão. Ao mesmo tempo que a gente não aguenta mais as noites em claro fazendo os trabalhos acadêmicos, ou no meu caso lidando com aulas das 18 às 21h40, deixar a rotina segura de ser estudante para profissional é um tanto assustador, e dizer tchau pra tanta gente que temos ume enorme carinho como nossos colegas e professores então, é daquelas tarefas que a gente passa os meses se preparando.
Mas como eu dizia, eu tinha muitos planos pra esse ano. O TCC que eu venho montando na minha cabeça desde que escolhi o assunto na qual queria abordar, as festinhas da turma pensadas para que o ano não fosse tão pesado. A gente tava montando pequenas comissões porque ninguém tinha grana pra fazer "festão" mas, isso não quer dizer que juntos não poderíamos fazer algo legal.
Ia ter ensaios fotográficos com a beca, vestidos bonitos, um salão decorado com as fotos que eu ia tirar com uma "camerinha" de plástico ao longo do ano. Tava tudo pensado.
Do nada, a faculdade anuncia que por medida de segurança, nos não deveríamos mais ir pra lá, ao contrario, agora eles teriam que achar um jeito de ir ate nós. Minha internet não era suficiente pra esse modelo de aula..., passei vários perrengues, não dei conta da minha grade do semestre, lidei com o que aguentei.
O TCC virou refugio.
Era horas e horas de estudo, me concentrando quase que exclusivamente no futuro. Vai passar, vai passar.
Ouvia a musica que tinha escolhido junto com Val pra fazer o vídeo da turma e chorava. Era muito injusto. Nosso último ano juntos, estávamos separados. O momento que eu vinha pensado tanto nos últimos meses não só me parecia (mais uma vez) distante, mas agora parecia bobo.
Milhares de pessoas morrendo e eu no alto do meu privilégio, trabalhando de casa e sofrendo que não estava podendo ver meus amigos e que talvez não poderia mais “comemorar” estar me formando (o que no Brasil, já é outro privilégio).
Ao mesmo tempo, aquele desespero, o que adianta me formar? Como vai ser sair em um mercado de trabalho que já e naturalmente saturado, num mundo pós-pandemia?
Era muita coisa, o coração palpitava.
Chegou julho, férias. Olhei o vestido que tinha escolhido pro jantar que faríamos em turma, completamente minha cara. Embalei num papel com cuidado e guardei numa caixa. Depois de tantos meses em casa, você começa a ser mais realista com a possibilidade de que postergar alguns planos podem fazer sentido.
As conversas sobre o que fazer no próximo semestre, depois da noticia de que o MEC havia autorizado aulas a distancia ate o final do ano, viraram cada vez mais frequentes. “será?” “Não sei o que fazer” “e agora?”
Alguns optaram por prosseguir, outros resolveram esperar. Não existe resposta certa aqui, existe? Mas de qualquer forma, a gente vai se separar. Talvez para alguns demore mais e para outros menos. Mas ainda vai acontecer, o ciclo vai ter que se fechar. A vida não tinha parado, por mais que as vezes sentíssemos que sim.
Engraçado como as canções da nossa infância fazem todo sentido agora.
Cazuza dizia que o tempo não para, e Renato Russo que temos todo tempo do mundo, porém, não temos tempo a perder. Qual o sentido aqui, é o que você deve se perguntar?
Para mim, o entendimento surgiu enquanto estava sentada na calçada da minha avó, vendo meus primos correrem, brincando no sol. Olhei pro céu azul e vi uma pipa rasgar o vento, então comentei que fazia anos que não via uma criança empinando. Passei horas desfrutando dessa experiência que se tornou rara no meu dia-a-dia, uma tarde de conversa e brincadeiras pra ser sentida e vivida bem devagarinho, como costumava fazer na meninice.
Se temos todo o tempo do mundo, por quê estamos sempre correndo contra ele e nunca parece ser suficiente? Uma das muitas lições que essa pandemia pôde nos ensinar é que precisamos desacelerar. Temos nosso próprio tempo...
O TCC será finalizado, o vestido guardado vai ser usado, as fotos serão tiradas, as festas acontecerão, o diploma será entregue e o emprego em algum momento vai aparecer. Não exatamente na mesma sincronia para todos, mas tudo bem também! Não estamos em uma corrida, certo?!
Formandos de 2020, somos tão jovens... O mundo está se reinventando, ficando mais forte e sim, está respirando! Nós resistimos e sobrevivemos, chegamos ao fim. Então, depois de tudo, um novo começo nos aguarda porque, afinal e apesar de tudo...
Ainda é tempo de vida!
Esse texto foi escrito em parceria com Valeria Cardoso (LinkedIn: https://www.linkedin.com/in/val%C3%A9ria-cardoso-60630b1a2/)